quinta-feira, 30 de julho de 2009

DIREITOS HUMANOS SÃO APENAS PARA PROTEGER BANDIDOS?

Marco Carvalho*




É necessário ressaltar que a frase-título nos infere a um contexto de revolta e desentendimento por parte dos policiais, e quiçá da sociedade, em virtude da falta de conhecimento dos direitos humanos. Possivelmente, se frutifica em função direta da história recente de nosso país, que trouxe a repressão durante o regime de ditadura militar, e em contrapartida, trouxe para os militantes de direitos humanos, o estigma de subversivos e perigosos para a segurança nacional, por lutarem contra atitudes violentas e desumanas praticadas por agentes do Estado daquela época.
A abordagem dos direitos humanos para o público policial pelo viés filosófico contribui para fortalecer o argumento de que a responsabilidade de se respeitá-los é genérica e, portanto, inerente a todos os cidadãos indiscriminadamente. Faz aflorar a indignação do policial quanto às cobranças das entidades de proteção dos direitos humanos recaídas sobre ele, por entender ser, “apenas ele”, responsabilizado e cobrado, enquanto os demais cidadãos, inclusive aqueles que estão à margem da lei, não sofrem tais exigências. Posicionam-se, portanto, como vítimas e perseguidos pelo sistema. Ao observarmos os direitos humanos sobre o enfoque ético, identificamos a idéia da responsabilização de todos no processo da construção de uma sociedade mais justa e mais humana.
Para Hobbes, a ausência de um poder coercitivo capaz de atemorizar aqueles que querem impor suas vontades, como se estivesse no estado natural de sua existência, acarreta a guerra de todos contra todos. Ele propõe um direito civil que garanta a paz. Na sua obra Leviatã, enfatiza que esse desejo de paz leva os homens a formar um contrato, o qual permite eleger um soberano para governar suas vidas definindo o direito e a justiça. Tal poder soberano é imprescindível para resolver as controvérsias. Sob seu ponto de vista, a insegurança causada pelo estado de guerra de todos contra todos chega a níveis tais que é mais seguro exigir uma força disciplinadora.
Rousseau tem opinião semelhante à de Hobbes, porém, amplia a concepção de pacto social e sua conceituação. Afirma ele que o homem civil, o cidadão, para consolidar sua liberdade moral, tem necessidade de eliminar em si a liberdade natural, responsável pelos distúrbios em sociedade. Em outras palavras, deve abdicar dos impulsos naturais em detrimento dos lastros morais impostos pela sociedade a qual faz parte, ou ainda, só pode reivindicar a liberdade, de acordo com as cláusulas estabelecidas no contrato social. A transformação do homem em cidadão, para Rousseau, é processada pelo legislador, o qual é considerado por ele como um Deus, pela necessidade de ser perfeito em legislar e exemplificar pelos seus atos.
A polícia é uma instituição do Estado encarregada da manutenção da ordem e da paz social. As violações praticadas por seus agentes são atribuídas a ele e as cobranças decorrentes de tais abusos, também. Não cabe aqui a responsabilização do indivíduo, mas do representante do Estado que, investido da autoridade e poder, agiu de forma arbitrária e violenta. Os delitos praticados pelos criminosos serão tratados sob a égide do direito penal e para tanto cabe o sistema de justiça criminal atuar. Porém, os atos ilegais praticados pelo Estado, nem sempre são objetos de responsabilização exemplar de seus agentes. Nesse sentido, os direitos humanos são evocados de forma intransigente, não só na esfera nacional, mas também com mecanismos internacionais de proteção.
Paulo Sérgio Pinheiro diz que uma violação isolada cometida por indivíduos privados ou grupo de pessoas, sem ligação com o Estado, obviamente não constitui violação de direitos humanos. Essa afirmativa, no entanto, só encontra eco se considerarmos que o único algoz, responsável por todas as violações dos Direitos Humanos, é o Estado, porém, não podemos esquecer que na sociedade moderna, o tecido social é esgarçado a todo o momento por uma rede paralela de poder que irremediavelmente afeta as relações entre os indivíduos e as instituições públicas e privadas, contribuindo para retirar dos cidadãos as garantias e liberdades preconizadas pelos institutos de proteção dos direitos humanos.
Entende-se que esta animosidade por parte dos policiais decorre do seu desconhecimento sobre a temática ou de sua discordância dos procedimentos práticos e legais de proteção desses direitos. A matéria Direitos Humanos até pouco tempo não fazia parte da grade curricular das escolas de formação policial no Brasil. O estudo nas polícias brasileiras surgiu da necessidade das instituições de segurança pública se adaptar aos novos tempos democráticos, os quais exigiam mudanças profundas na máquina estatal. As constantes denúncias de violações sistemáticas dos direitos humanos daqueles que estavam sob a custódia da polícia, as pressões sociais para a extinção de alguns órgãos de segurança pública que desrespeitavam os direitos inalienáveis à vida e a integridade física, tudo isto trouxe consigo a necessidade de buscar tais soluções.
Ocorre, contudo, que o tema Direitos Humanos é apresentado de forma utópica, sem nenhum conteúdo prático para atividade profissional do cidadão policial, e o que é pior, sem uma indicação metodológica que o transporte do campo filosófico para o real. Apesar disso, no entanto, podemos afirmar hoje que o policial de uma forma geral ouviu falar de direitos humanos, mesmo que teoricamente, porém não vislumbra como esse discurso poderia ser incorporado a sua prática diária profissional, principalmente porque não percebe a dimensão pedagógica de sua profissão para a construção de uma sociedade democrática, restringindo-se a encarar sua atividade como a de um “caçador de bandidos” e “ lixeiro da sociedade”, como, aliás, a maioria da sociedade assim o tem.
Mais que simplesmente denunciar as violações dos direitos humanos praticados pelos policiais e clamar pela prisão dos violadores, há de se buscar discutir ações efetivas de redução dessa prática, ou seja, construir o método para modificar a cultura de violência e repressão existente, não só no entremeio policial, mas na sociedade como um todo. Inclui-se nesse viés a reformulação dos métodos de treinamento e técnicas de emprego da força policial. Ou ainda, que tenham na polícia uma aliada na construção de uma sociedade cidadã, promovendo esforços que visem contribuir para as mudanças no aparelho policial e na valorização dos seus integrantes. Estes são os legítimos representantes do poder de um Estado democrático e indivíduos também sujeitos de direito e proteção.
Essa é a ótica pela qual o policial deve haver-se. No exercício de sua profissão, incorpora o poder e a responsabilidade emanada pelo Estado e para tal é responsabilizado. Conhecedor do histórico da luta política dos Direitos Humanos para se afirmar como instrumento de proteção dos fracos contra o poder do Estado, o policial claramente identificará seu papel nesse cenário, não dispondo mais de argumentos para afirmar que Direitos humanos é só para proteger bandido. Reconhecendo-se também como cidadão, sujeito à violência desse Estado, compreenderá que ele também é carente de proteção.


BIBLIOGRAFIA



COMPARATO Fábio K. Fundamentos dos Direitos Humanos: NET, seção Direitos Humanos – Textos e reflexões. Disponível em http://www.dhnet.org.br acesso em Ago2008.
HOBBES, Thomas. Leviatã, ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil, São Paulo : Abril Cultural, 1983.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato Social (1757), São Paulo : Abril Cultural, 1985.
PINHEIRO Paulo Sérgio. Direitos Humanos contra poder: NET, seção Direitos Humanos – Textos e reflexões. Disponível em http://www.dhnet.org.br acesso em Ago2008.


*Bacharel e Especialista em Segurança Pública, com Extensão em Análise Criminal (Instituto de Ensino Superior de Brasília). Oficial da Polícia Militar de Sergipe.

ENTREVISTA: CEL PEDROSO, COMANDANTE GERAL DA PMSE FALA SOBRE PRESENTE E FUTURO DA INSTITUIÇÃO


José Carlos Pedroso Assumpção, 49 anos. Meio Campo de longa data do time de Oficiais da PMSE (muito antes de assumir o posto atual, para os que poderiam achar que “só joga por ser o ‘dono’ da bola”), tem muito para falar sobre seus pouco mais de 60 dias de Comando, sobre marketing e endomarketing institucional e sobre o futuro da gestão da segurança pública em Sergipe. O Papamike 1835 entrevistou o Comandante Geral da PMSE, que colocou seus pontos de vista e quais os próximos passos da corporação em busca da excelência dos serviços:

Papamike 1835 – Comandante, passamos recentemente por momentos diferentes na PMSE, por ocasião da negociação para valorização do policial militar. Pouco mais de 60 dias após sua posse, observamos uma considerável melhora nas estatísticas contra o crime, na confiança da sociedade e na moral da tropa. Em sua opinião, quais os motivos que levaram a tal resultado?

Cel. Pedroso – Fico feliz em saber que estamos trilhando o bom caminho, mas há muito ainda por fazer. Em 29 anos de coturno, ouvi muita coisa pelos corredores, e não posso negar que recebi apoio incondicional de segmentos importantes para dar bom termo aos assuntos mais emergentes. O Excelentíssimo Governador do Estado, Marcelo Deda, desde os primeiros minutos deste Comando ouviu atentamente nossos argumentos e entendeu (e apostou) em nossa proposta. Ao mesmo tempo em que a sociedade discute sobre a desmilitarização das polícias, observamos que cada vez mais as empresas e instituições adotam nossa maneira de administrar, enaltecem a hierarquia e disciplina e debate com seu público e patrão (que no nosso caso é a sociedade) sobre sua filosofia e comportamento. A tropa confiou, interagiu e manteve-se fiel, o que foi decisivo. Nossos problemas não surgiram como em um passe de mágica, foram se consolidando através das décadas, silenciosos. A frase é recorrente, mas não me incomoda ser redundante quando afirmo que o povo é nosso chefe, e pagará os salários de cada operador de segurança pública. Cada um de meus antecessores deu sua contribuição para a evolução da PMSE, e sinto-me privilegiado por ter ao meu lado tantos e tão valorosos profissionais, motivados, com equipamentos modernos e pensando polícia junto com a sociedade. Estes, sim, são os que devem ser enaltecidos, e deles esperamos ainda mais, sabemos o potencial humano que temos. A Polícia Militar é um sacerdócio, exige empenho, compromisso, transparência, respeito às leis, ao ético, à moralidade. As equipes são mais fortes que o indivíduo, nada seria possível sem estes que fazem e farão nossa corporação cada vez mais forte.

PM1835 – Os veículos de comunicação tem noticiado muitas prisões, assaltos frustrados pela PM, remanejamento de efetivos e abertura de novas Companhias e PACs (Postos de Atendimento ao Cidadão). Vem mais por aí?

CP – Temos incessantemente buscado resultados satisfatórios na construção de um ciclo que se retroalimenta: Se o povo confia na Polícia Militar, ele interage, critica, fiscaliza, contribui e aponta caminhos. Quando isso ocorre, os resultados se potencializam, e os bons ventos começam a soprar do lado da lei, o que faz com que a população confie mais. Nossa própria anatomia (dois ouvidos e uma boca) nos sugere que devemos ouvir mais e falar menos, e daí surgiu uma idéia simples: OUVIR. O povo sabe onde o seu calo aperta, os integrantes da “Briosa” estão entre os mais qualificados profissionais do país, sendo requisitados para ajudar em outros Estados maiores e com problemas de segurança que não chegam a Sergipe por causa de seu bom trabalho e da política de Estado em Segurança Pública. Os resultados imediatos mostram uma PMSE fortalecida, atuante, eficaz. Passada esta fase, continuaremos ocupando os espaços de forma sustentável. A criminologia ambiental (uma de suas correntes) defende que para haver crime, é necessário que haja a vítima, ou que o ofensor encontre a oportunidade de agir, o que normalmente ocorre pela ausência do guardião. Nosso efetivo atual (cerca de 5700 policiais) é bem pequeno, e como concurso e curso de formação demandam um tempo que a sociedade não dispõe, estamos nos reorganizando para que o mesmo efetivo cubra uma área maior. Certamente ocorrerão remanejamentos e novas formas de policiar, mas tudo a partir de estudos concludentes. Com decisões estratégicas eivadas pela técnica e apartadas daquelas meramente políticas, daremos orgulho ao povo sergipano.

PM 1835 – O policiamento comunitário permanecerá forte?

CP – Mais do que nunca. O distanciamento com a comunidade, defendido por O.Wilson (policiólogo americano), era eficaz para a estratégia necessária ao momento pelo qual passava a segurança pública americana. Eram os especialistas, distantes da comunidade e em escalas de serviço rotativas para minimizar ingerências políticas. Robert Peel (policiólogo londrino, criador do que mais tarde conheceríamos como Scotland Yard) pensou no policial generalista, próximo da comunidade e pronto para atendê-la. Com este viés, buscaremos nosso lugar junto ao povo. O novo sítio da PMSE privilegia o relacionamento com a imprensa e com a população. A própria imprensa ajudará a construir seu espaço no endereço eletrônico (Sala de Imprensa), dizendo o que seria importante para ela na árdua missão de informar. O próprio Blog foi pensado para privilegiar o estreitamento dos contatos com o povo. Com sobriedade e compromisso, ouviremos nossos integrantes e os das co-irmãs, a sociedade, os estudantes e profissionais diversos, interagindo, explicando, ensinando e aprendendo com todos. A PMSE é da sociedade, nada mais justo que ela (a sociedade) tenha vez e voz.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

NA POSIÇÃO DE SENTIDO, O MILITAR PODE DIZER O QUE QUISER!

Ouvimos esta frase certa feita de um destacado Coronel da PMSE. O que se mostra por trás da doce metáfora utilizada pelo experimentado Oficial traduz-se no próprio desejo da polícia moderna em prestar um serviço de excelência. Em um momento histórico que vivemos, onde as instituições policiais cada vez mais caminham ouvindo seus próprios integrantes e a sociedade a que serve, oferecemos um espaço onde os que fazem a PMSE, os policiólogos, jornalistas, professores, estudantes, pesquisadores ou qualquer cidadão possa se manifestar, interagir expondo suas idéias e discutindo temas propostos pelos próprios leitores e seguidores. Pautados sempre pela legalidade, moralidade e ética, o blog moderará discussões pertinentes e de interesse da segurança pública.

A briosa Polícia Militar de Sergipe, instituição sesquicentenária, convida VOCÊ a discutir seus próprios temas aqui! E não pára por aí... existem várias funcionalidades que não foram acrescentadas propositalmente. O Blog pode ter cores diferentes, símbolos, enquetes, contador, links ou o que quisermos. Envie suas sugestões através dos comentários aos textos... a liberdade é total, inclusive para publicar textos autorais pertinentes.

As sugestões de temas a discutir sairão de nossos próprios comentários. Podem ser colocados em pauta assuntos como a nova Lei de Organização Básica da PMSE, sobre a PEC 300, sobre abordagem, sobre uma matéria jornalística ou qualquer outro assunto. Nossos moderadores intercederão apenas quando julgarem haver flagrantes contra a lei, os bons costumes e contra a ética, mas esperamos que isto ocorra o mínimo possível (na verdade, esperamos que não ocorra). Em nossa instituição, temos doutores e pós-doutores, mestres e especialistas, formados nas mais diversas áreas do conhecimento humano. Não será incomum publicarmos textos e interagir em comentários com um de nossos juristas, médicos, jornalistas, pedagogos, psicólogos, atletas, especialistas das mais diversas expertises e policiólogos com olhares dos mais diversos. Tem dúvida? Poste aqui... observações? Textos? Comentários? Críticas? Elogios? Bem, seja bem vindo, puxe uma cadeira confortável na frente do seu monitor e comece a construir o Papamike 1835. Divulgue para seus amigos... se alguém perguntar por quê esse nome, fale que Papa Mike é PM no alfabeto internacional, e 1835 foi o ano de criação da PMSE, e mostre como está plugado nos novos rumos da sociedade moderna. Fique à vontade, afinal... você sempre foi o patrão, não é mesmo?


Teorema da incompletude

A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.

Não agüento ser apenas um sujeito que abre portas
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc etc.

Perdoai
Mas eu preciso ser Outros
Eu penso renovar o homem usando borboletas.

Manoel de Barros
Livro das Ignorâncias